sexta-feira, 1 de julho de 2011

Inventário dos ventos....


Hoje no finalzinho da manhã fui surpreendido por uma interessante situação e, até certo, ponto esclarecedora. Esclarecedora por que servia de chave para algumas de minhas lógicas internas, altamente desconcertantes. Justificava alguns andamentos, de séculos atrás, que nem eu entendia mais o objetivo, pelo grande acumulo de tempo para a execução. Logo na rua em frente a minha casa vi alguns meninos soltando pipas e me lembrei que estamos justamente na “fase das pipas”. Período este que compreende do final de maio ao final de setembro mais ou menos. Reparei, apontando o cenário maior, que diversas pipas estavam no ar, na minha perspectiva de visão. Grandes, coloridas e esvoaçantes. Todas elas numa corrente de palavras e sentidos particulares que as permitia subir ou descer, majestosamente.
Três meninos compunham o elenco principal do que estava acontecendo diante de meus olhos, do meu cenário-espetáculo-entendimento. Apenas um detinha uma pipa em seus domínios, e os outros acompanhavam a operação de manuseio. Isso segue esta lógica desde toda a eternidade: apenas um pequeno grupo possui as pipas, os outros se tornam as “adjacências”, ou em outras palavras, seguidores. Sem qualquer desmerecimento ou diferenciação imediata das categorias, é bom pontuar isto. Os meninos tinham quase que as mesmas características. Não me lembro de nada que os diferenciasse, fisicamente falando. Mas também é interessante considerar que havia uma razoável distância que me impossibilitava identificar algum elemento estranho que pudesse pontuar neste momento. Enfim cegueira genética.
Eles corriam. Ou melhor, dois deles, os sem-pipas, corriam. E o portador daquele instrumento de desejo, por assim ser, mantinha-se parado, estático, apenas movimentando limitadamente as suas posses, a pipa. Era como se ele estivesse engessado naquele momento segurando aquele fio. Enquanto os outros se movimentavam livremente, ele girava em poucos metros num pequeno raio de ação. Ele era o DONO, mas este poder o limitava a pouquíssimas ações. Ele não era tão livre como os outros meninos. Ele poderia ser o tal, ser detentor do poder naquele momento, mas estava preso à construção que fizera e que o impedia de sair daquela determinada corrente de ar, afinal: a pipa poderia cair.
Reparei ainda que os maiores sorrisos não irradiava daquele que estava de algum modo ligado a um fio, a uma linha de pipa. O DONO da pipa sorria. Sorria por estar onde estava e sorria pela posse, invejada posse. Os outros sorriam por fazer parte daquele circuito, também, e por ter a liberdade de se movimentar, de não estar ligado a nada ou a ninguém. Estavam felizes por não ter a responsabilidade de segurar firmemente a linha de ninguém. A mesma linha que segura é a que prende, que aprisiona. As vezes segurança e prisão podem trabalhar na mesma lógica e período, depende de qual janela se olha.
Existem inúmeros lados para se tratar o momento em que aquele menino se ligava a algo (a pipa, por enquanto!) e para tratar das adjacências deste fato. Geralmente escolho os piores, nem sei por que. Todos poderiam interpretar aquilo de acordo com sua escala de valores, eu vou pela minha. E de acordo com meus entendimentos, (sim, plural!) acredito que nenhum dos lugares apontados neste caso são satisfatórios, ao menos para mim.
De um lado alguns deles mantém a liberdade de poder andar para todos os lados, de fazer tudo, sem se preocupar com o que deve ser mantido. Algo que estabeleça uma ligação que, caso seja rompida, desencadeie algum tipo de perda. Ou de algo, ou de posto, ou até mesmo de gente! Isso no sentido maior dos termos para evitar as particularidades das situações. O que se conquista por si só não deve ser perdido tão facilmente por qualquer vento. Aliás, nada do que se conquista deve ser perdido. Ou talvez se perca o que nunca foi conquistado efetivamente. Mas isto é uma questão de entendimentos e temporalidades: envolvem máscaras, desentendimentos, desencontros, inverdades... Tudo isso ao desenrolar dos dias de dentro, que não são visíveis por todos.
Eles não são irresponsáveis por não possuir um fio que os ligasse a algo. É um modo de interpretar a realidade, uma escolha de ventos, de marés. Ter ou não ter linhas é uma escolha, com seus ganhos e perdas. Mas se andar sem certas linhas o vento leva para qualquer lugar. E isso nem sempre é negativo. Linhas são importantes, mas linhas também são limitáveis!
Por outro lado existem os espaços de ligação que compreendem um ponto a outro, o menino e a dita pipa. “Existem linhas de todos os tipos.” (2011) E elas compreendem a determinadas lógicas que não necessariamente obedecem a idéia de que compreendem o menor espaço entre dois pontos. As sinuosidades dos caminhos dão margem a tantas ocupações intermediárias a estes espaços, e eu infelizmente não tenho muita propriedade para tratar disso. Acho que ninguém possui, até por que no que concerne a isso se vive, e não se teoriza.
As palavras se atrevem a ocupar em alguns momentos estes espaços. Elas são como objetos, bens. Objetos dos quais selecionamos e utilizamos com maior ou menor freqüência de acordo com as “temperamentações interiores”. Existem os bons, os péssimos, e os de mal gosto. Sim, os de mau gosto! Todos selecionamos os objetos que vão figurar em nossas relações. Algumas pessoas escolhem poucos, outras muitos, outras utilizam com uma freqüência insuportável, e por aí vai. Gosto das poucas palavras, na grande maioria das vezes. Gosto de muitos olhares, em pequenos momentos. O transito dos olhos permeiam significados mais subjetivos que o soar dos lábios.... as vezes é bom sonhar um pouco.
 Então, por enquanto, ando por cima da linha. Acredito ser melhor segurar pelos pés e caminhos o que se deseja, que pelas mãos e engessamentos aquilo que pode nos limitar. Enquanto se caminha, por escolha (tsic), pelas intermediações não se perde a dimensão do ponto de raiz, e também do ponto do desejo, do desejado. Valendo sempre a idéia de que a lógica do caminho não consiste unicamente em olhar para o ponto de chegada, principalmente por que o ponto de chegada é uma possibilidade, muitas vezes ilusórias. Podemos construir pontos de chegada antes dos passos, depende não de onde ou quando você quer chegar, e sim de como, inteiro ou aos pedaços ...    

(Augustu, 20.06.2011_15:20 hs)   
   

Intermediações, talheres e desnecessidades!


O grande espetáculo reflexivo de hoje. Planejado a umas duas metades de séculos mais ou menos. Não sabia que ainda encenava tão bem, com tamanha maestria. Foram espectadores paredes seculares, tacos de assoalho e os distintos talheres. Todos dispostos em seus devidos lugares, se iniciou a degustação de afiadas palavras. Palavras atravessadas, atravessáveis.
Incrível como num pequeno espaço de tempo tantas informações soaram e morreram, também, na mesma intensidade. Tantos espaços verbais a serem ocupados. Uns quietos, outros calados e outros, pasmem, mudos! Nos diálogos menos anormais as palavras costumam voar grávidas de sentidos. Cruzando falares e entendimentos, gerando toda a sorte de expressões. Desta vez não. Toda a aridez da cena desembocava em apenas um tipo de postura. Não quero comentá-la.
Mas eu não fui o grande mentor da cena. Me convidaram para compor a mesa. Fui, devia ir!  
Olhares, meias palavras e águas que rolavam por dentro, para todos os lados inclusive para cima. Um imenso jogo mortal em que cada uma das sílabas dançava no ar, dotada de toneladas de venenos. Risos brilhantes, olhos largos e convidativos. Cada um se construindo de espelhos, refletindo todas as naturezas e possibilidades dos Eus alheios. Que belo espetáculo, e triste também. Os aplausos circunscreveram-se ao trincar dos talheres, e das almas por assim (saber) ser.
Mas mainha estava certa, e sempre esteve: “Pare de ser tão dramático menino!”

(Augustu, 15.06.2011_16:20 hs)   
   

quinta-feira, 30 de junho de 2011

Pentes de Pregos


Levemente os ventos convidaram-me a sentar no ponto mais alto dos meus domínios. Parei por alguns instantes a contemplar as irresistíveis correntes de pensamentos que me carregavam de um lado para o outro, sem definição de chegada, ou eu mesmo já pensava que não haveria chegada, e só caminho. Tratei de me compreender neste círculo.
Sabia que seria interessante quebrar aquela rotina de milênios: já não seguia o espontâneo fazia algum tempo. (Nem mesmo aqueles que tinham nomes fortes e bem próximos.) Pouco a pouco consegui subir, degrau a degrau, naquelas ondas de dispersões até chegar ao ponto almejado, pelo outro, por assim compreender ou até mesmo ser.
Um belo lugar num belo momento, o céu rasgava-se em diversos tons de um fim de tarde. Atravessando cores entre um rosa chá ao lilás azulado, num crescente fundo preto. Sentei-me numa das telhas, aquela que me dava uma maior segurança. Sei que uma queda dos meus pensamentos apagaria qualquer possibilidade de realizar um sonho das 17:30 horas ou algo do tipo. Deveria estar inteiro, no maior sentido do termo.
Esperei e esperei. Por alguns milênios fiquei ali, construindo um vazio, na fila do nada a espera do desfecho do convite. Por alguns instantes pensei em descer, confesso, mas daria muito trabalho me decepcionar com um vazio, dito improdutivo. Pré improdutivo. Sabia que não aconteceria muita coisa se continuasse imóvel e com frio vendo todas aquelas cores se esvaírem das minhas mãos-olhos.
Então, num grande gesto de coragem e insensatez passei meus dedos mais afiados por uma de minhas pernas e puxei, lascando, uma grande tira de mim. Ao esticar o meu EU percebi que os pensamentos, as cores e os ventos, com cheiro de telha molhada, faziam vibrar um som diferente. Meio triste, monossílabo, como os últimos séculos de maio e junho.
Me acostumei com aquilo, com o som. Então puxei mais uma tira e fiz um som diferente. Não era mais o outro que fazia o som em mim, de minhas mãos EU fazia o som em mim. E passei todo aquele resto de cores dedilhando o que se havia configurado como pedaços de mim. Sons que se construíam pelo passar do que vinha de fora, e apenas passava, com o que meus dedos conseguiam tirar com o movimento de meus dedos-olhos.
Já nem reparava mais que toda aquela aquarela-cenário havia sido desfeita no meu concerto sobre as desgastadas telhas. Havia apenas um fundo preto, negro e cintilante, com pedaços de mim voando, luzindo e zoando no caminho dos ventos, que passavam. Talvez nem saísse mais daquele lugar, daquela música. Talvez me desfizesse todo em tiras, sons e cores. Talvez virasse um outro convite ao vento, esperando que um outro indeciso subisse num precipício e pusesse em prática seus complexos mais insanos. Mas que ele soubesse, tanto quanto eu sabia, que todos os EUs-convites de vento passam.... só o som das tiras permanece. O som e as marcas....   

  (Augustu, 30.06.2011_23:20 hs)   
   

quinta-feira, 5 de maio de 2011

Palavras corrosivas


Nem caberia mais se pensar nesta perspectiva. Nesta dialética desnecessária e inexistente. Mas existem resíduos, sabe? Existem restos de dias que penetraram nas paredes da alma de forma quase impossível de se retirar, de se subtrair. Se puxado, como convencionalmente se espera, deixa o buraco. Ferindo a atmosfera interior, enchendo de outros, passados pela abertura, apodrecendo os ares de dentro. Ares próprios, ares específicos, ares Atlânticos, por assim dizer/tratar.
Estes resquícios não tem a menor serventia. Manter? Continuar o descontinuo, só eu mesmo. Mas fica aí: desnecessariamente desnecessário. Lançando idéias. Corroendo verbalmente os interiores, ruindo os lagos (só os salgados!) até a casca epidérmica se afinar de uma vez e a luz do sol adquirir competência suficiente para romper e entrar. Escurecendo o fora, e clareando os dentro(s). Numa matização de dias e noites regados pela mesma colher de sal, cultivados em cativeiro, dentro das pálpebras. Tornando o dentro e fora um só. Abstraindo as circunscrições de antes, as fronteiras, os cheiros e novamente os cheiros. Principalmente os que não se sente mais.
Liberando. É, liberando... num único e querido furto de mim. Uma vez fronteira rompida, se desconhece as substâncias de mim. Viro sim, viro luz de sol!

(Augustu, 05.05.2011_23:30 hs) 

terça-feira, 3 de maio de 2011

Noites de EUs, MIMs e TUs


Hoje acordei com uma vontade de mudança. Não queria nem o mesmo céu, nem as mesmas flores. Parei alguns minutos pensando numa estratégia que fosse competente o suficiente para mudar tudo num minúsculo espaço de tempo. Voei. Voei sim, para o único lugar que poderia me auxiliar naquele momento. Voei para os setores mais altos da minha memória. Memória sim! Mudanças sem raízes não são mudanças, são ilusões temporárias.
Subi até as compotas mais volumosas do meu inconsciente. Abri de uma só vez todos os vãos de liberação, e fiquei na frente. Recebi toda aquela dose de mim de uma vez. Foi perfeito.
Senti uma imensa satisfação em ver meu Eu totalmente inundado de MIMs. Não necessariamente de EUs e MIMs, se é que me entende. Os EUs e MIMs são dotados de TUs também. Nem precisava pontuar aqui.
Foi isso. Senti toda aquela enxurrada passando, lavando, levando tudo na frente. Tirando todas as linhas do paralelismo insuportável que elas andavam. Surtei ao ver as mesmices se esfacelando no tombo contra os troncos de minhas florestas interiores. Arrancando as pedras, as casas, os corpos plantados outrora no chão, nos pântanos e nos jardins também. Tudo. Foi trabalho de milênios em poucos segundos.
Depois afastamos nossos lábios e eu pude enxergar todo o terreno altamente limpo, e pronto para se plantar tudo, novamente. 

(Augustu, 03.05.2011_12:34 hs)